Perdi-te

Perdi-te naquele instante. Como se uma brisa passasse por entre as árvores e acarinhasse as folhas, que na realidade só lá estão à espera daquele momento. Eu não estava à espera desse momento. Não hoje, não agora, não nunca. Perdi-te naquele instante de hesitação entre o fim da pergunta e o início da resposta – sim, aquele momento em que as tuas palavras balançaram à espera que respondesse por ti, quase como se fosse eu que te desse a deixa para dizermos o mesmo.
Perdi-te no alívio que não saiu de ti e no peso que se manteve em mim, no baloiçar da articulação das palavras que por algum motivo não conseguias pronunciar. Já te tinha perdido antes mas, teimosa e egoísta que sou, insisti em manter-te por cá. Por medo, sim, de não ser nada, de não restar nada dentro de mim que se aproveitasse. Medo de que a construção do meu pequeno castelo, que já ia a meio, embargasse, e que tivesse de fazer as malas e caminhar loucamente à procura de outro sítio onde pudesse colocar novas fundações. Medo que nesse caminho me apercebesse de que não há sítio suficientemente bom que possa sustentar uma base sólida, porque o outro era melhor e nada será melhor que o outro. No outro estavam memórias, partes e pedaços de mim e de ti. Estavam as minhas cicatrizes, as minhas dores, os sonhos que eu achei serem nossos.
Perdi-te, mas foste tu que me encontraste. Tu viste-me quando eu achava que era invisível e trouxeste-me da sombra. Devias ter-me deixado lá ficar, em vez de me trazeres para o meio desta trapalhada em que se tornou a nossa vida, porque agora vou ter que fazer o caminho de volta e a minha sombra vai lá estar a dizer que me avisou. Vou ter de chorar como se fizesse o luto a alguém que ainda está vivo, mantendo a aparência de que tudo está bem enquanto o meu coração, silenciosamente, grita de dor. Não te vou ter, mas mais que isso, não vou ter a tua presença em todos os aspectos e partes da minha vida, e vou sentir a tua falta em todas as camadas da minha alma. Tanto, que já nem me lembro como é não me sentir completamente despedaçada.
Vou estar aqui sozinha neste oceano com ondas de emoções que sei que por vezes vão ser calmas e outras vezes me vão enrolar de uma tal maneira que tudo o que eu posso fazer é tentar nadar, na esperança de não me afogar nesta ansiedade. À espera que haja por aí um colete salva vidas que não me deixe ir ao fundo, que me deixe ganhar ar.

Perdi-te, e vou-te sentir a falta para sempre.

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